Edição Jul-Ago 2025 Publicado em: 12 agosto 2025 | 13:00h

O cuidado centrado na pessoa

A experiência do Paciente em laboratórios clínicos - da teoria à prática

 

Por Claudia Meira
 

Na medicina laboratorial temos evoluído muito quando se trata de melhorar os processos pre-analíticos, analíticos e pós analíticos, sempre com um olhar para os processos internos, como por exemplo, controles internos e externos da qualidade, validação e verificação de métodos, gestão de equipamentos, gestão da informação e laudos, gestão de riscos e segurança do paciente e outros. Quando se trata do olhar para o paciente, muitos laboratórios têm utilizado métricas para medir a satisfação do cliente, como CSAT - Customer Satisfaction Score, NPS - Net Promoter Score e CES - Customer Effort Score.

No entanto, as recomendações científicas, assim como a norma PALC, orientam expandir o olhar não só sobre o paciente, mas sim, para o Cuidado Centrado na Pessoa (CCP), destacando a importância de "conhecer a pessoa por trás do paciente – como um ser humano com razão, vontade, sentimentos e necessidades – a fim de engajá-la como parceira ativa em seus cuidados"1.

 O cuidado centrado na pessoa (CCP) vai muito além de fazer uma coleta correta de amostra e liberar um resultado compatível com a clínica. Implica em tratar as pessoas com dignidade, fornecer informações suficientes para que as pessoas tomem decisões sobre seus exames e cuidados, oferecer apoio emocional e social, preferências e valores individuais, atendendo às diversas necessidades de pessoas diversas. No caso de paciente pediátrico, paciente neuro divergente, pacientes com necessidades especiais, assim como no atendimento a pacientes idosos, com acompanhantes e/ou cuidadores, o cuidado deve ser centrado na família (CCF).  

O Picker Institute, define que o cuidado "centrado na pessoa" significa reconhecer a experiência de todos, desde pacientes e usuários dos serviços até funcionários, cuidadores, amigos e familiares. Com base em pesquisas com este stakeholders, foram desenvolvidos os oito Princípios do Cuidado Centrado na Pessoa que podem ser adaptados para aplicação na medicina laboratorial, conforme abordagens abaixo:

1. Acesso rápido a aconselhamento confiável sobre saúde: facilidade de agendamento de exames de acordo com as suas necessidades especiais e tempo hábil para diagnóstico; disponibilidade de profissionais do laboratório, capacitados e de fácil contato, para esclarecimento de dúvidas em relação aos exames.

2. Tratamento eficaz por profissionais de confiança: profissionais do laboratório demonstram respeito, cuidado, empatia, segurança e têm conhecimento e habilidades técnicas e comportamentais para tratar com crianças e adolescentes, incluindo pacientes especiais.

3. Continuidade dos cuidados e transições suaves: garantir que as transições sejam fluidas é vital para um cuidado coordenado e centrado na pessoa. O profissional de laboratório tem ciência das informações importantes a respeito do paciente que possam impactar na realização do exame e/ou na interpretação do resultado. Comunicam resultados críticos e, em caso de reação e/ou evento adverso, tem definido referências e contrarreferências, claramente divulgadas aos profissionais do laboratório, em caso da necessidade de continuidade do cuidado em unidade de saúde complementar.

4. Envolvimento e apoio à família e aos cuidadores: Os profissionais do laboratório são capazes de reconhecer, acolher e apoiar a importância das famílias, cuidadores, amigos e redes de apoio para a saúde e o bem-estar geral das pessoas, incluindo as famílias de atendimento pediátrico e de crianças com necessidades de saúde complexas, como os neuro divergentes e pacientes com necessidades especiais. 

5. Informação clara, comunicação e apoio para o autocuidado: as pessoas devem receber informações confiáveis, de alta qualidade e acessíveis em todas as etapas de sua jornada laboratorial, em linguagem acessível e adequada ao letramento do paciente, da família e/ou de cuidadores, sobre os exames como preparo, tempo de espera ou cuidados pós-coleta e questões importantes que os pacientes têm sobre o tema. Disponibiliza também informações claras sobre a indicação de exames e como os resultados podem impactar no autocuidado do paciente assim como sobre orientações pós exames para evitar complicações.

6. Envolvimento nas decisões e respeito pelas preferências: O profissional do laboratório esclarece previa e claramente sobre a realização dos exames e dá a oportunidade do paciente ser ouvido e permite que ele tome a decisão de realizar ou não o exame. Os pacientes são questionados, ouvidos e respeitados em relação a suas preferências, valores sociais, culturais, necessidades e preferências, como restrições físicas, idioma, identidade de gênero, pacientes divergentes e com necessidades específicas, entre outras. 

7. Apoio emocional, empatia e respeito: o cuidado centrado na pessoa exige uma abordagem atenciosa e holística, demonstrando empatia e respeito, reconhecendo as necessidades emocionais de cada indivíduo. Cada pessoa, de acordo com suas crenças, valores e cultura pode apresentar apreensões frente a exames que muitos consideram “simples”, seja pelo medo ao procedimento em si ou medo do diagnóstico ou expectativa do resultado. 

8. Atenção às necessidades físicas e ambientais: as pessoas merecem ser tratadas e cuidadas em ambientes seguros e confortáveis que lhes proporcionem privacidade e dignidade, incluindo o respeito à privacidade e acessibilidade, independentemente da idade, gênero e necessidade físicas. 

A versão 2025 da Norma PALC incorporou o "Cuidado Centrado na Pessoa" como item de avaliação, destacando a responsabilidade da liderança do laboratório em promover ações que integrem as necessidades e expectativas dos pacientes ao longo da jornada diagnóstica.

Os requisitos da Norma estão alinhados com os Princípos do Picker Institute, e incluem: identificação de barreiras de acesso; respeito às preferências e valores dos pacientes; coordenação do cuidado entre níveis assistenciais; promoção da experiência do paciente; educação e letramento em saúde para decisões informadas; conforto físico e suporte emocional; envolvimento de familiares e comunidade conforme preferências; e valorização dos exames laboratoriais nos desfechos clínicos. A norma também enfatiza a importância de que todos os colaboradores compreendam e contribuam para o respeito aos direitos dos pacientes, assegurando sua comunicação às partes interessadas4.

E como todas estas interações são percebidas pelo paciente? Segundo a Patient Centricity Consulting, a Experiência do Paciente (EP) é o que a pessoa vivencia em todas as dimensões (física, emocional, espiritual e social) no momento do enfretamento da sua condição de saúde, desde o início de sua jornada até as perspectivas de futuro.

Uma boa EP compreende o paciente se sentir acolhido, envolvido e entender o que realmente importa para ele5. A EP está relacionada à perspectiva do paciente (e não do laboratório), embora esteja influenciada pelas interações do paciente e familiares com a instituição e pela cultura da organização e deve levar em conta outras particularidades que incluem a qualidade e segurança do paciente e o cuidado centrado no paciente, no qual o paciente é colocado no centro do processo do cuidado. Compreender a experiência do paciente é um passo fundamental para avançar em direção ao cuidado centrado no paciente.

Lembrando que a satisfação do paciente avalia as expectativas dos pacientes e se essas expectativas foram atendidas. A experiência do paciente considera se - ou com que frequência - vários aspectos do cuidado ocorreram.

Avaliar a experiência do paciente, juntamente com outros componentes, como eficiência, eficácia, e segurança do cuidado, é essencial para fornecer um panorama completo da qualidade da assistência à saúde devendo ocorrer em todos os serviços de saúde, incluindo a medicina laboratorial. Permite identificar áreas para melhoria e deve abranger todos os aspectos e/ou fases da jornada do paciente no laboratório clínico. 

Mais detalhe sobre o tema você encontra no capítulo 32 - Cuidado Centrado na Pessoa e Governança Clínica, do Livro Recomendações da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML): Gestão da Qualidade em Medicina Laboratorial – autores: Claudia Meira, Felipe Augusto Rodrigues e Natasha Slhessarenko.

Bibliografia:

1. Person-Centered Equity (PCE) Lab. UCSF – University of California San Francisco. Disponível em: https://personcenteredequitylab.ucsf.edu/. Acessado em 23 de junho de 2025.

2. FORSTER, AS. et al. Measuring patient experience of diagnostic care andAcceptability of testing, De Gruyter. Diagnosis 2021; 8(3): 317–321. Disponível em: https://doi.org/10.1515/dx-2020-0112

3. Picker Institute. Principles of patient centred care; 2018. Available from:  http://www.picker.org/about-us/principles-of-patient centred-care. Acessado em 22 de junho de 2025

4. Norma PALC, versão 2025. Disponível em: https://bibliotecasbpc.org.br/index.php?P=4&C=0.5. Acessado em 13 de junho de 2025.

5. RODRIGUES, K.C. Experiência do paciente. Como criar, implementar e gerir bem um Programa de Excelência em Experiência de Paciente. São Paulo, SP: Patient Centricity Books, 2023. 

6. AHPS Patient Experience Surveys and Guidance. Content last reviewed May 2024. Agency for Healthcare Research and Quality, Rockville, MD.
https://www.ahrq.gov/cahps/surveys-guidance/index.html. Acessado em: 23 de junho de 2025