Laboratório clínico e saúde pública ganham protagonismo no enfrentamento da mudança climática
A crise climática é uma realidade que já impacta diretamente a saúde da população e exige respostas urgentes do setor de saúde. O tema ganhou destaque nesta quinta-feira, 18, durante o 57º Congresso Brasileiro de Patologia Clínica e Medicina Laboratorial (CBPCML), com discussões sobre os riscos à saúde, os efeitos da poluição do ar e das mudanças ambientais, e o papel estratégico dos laboratórios clínicos na adaptação e mitigação desses impactos.
Natasha Slhessarenko, pediatra, patologista clínica e coordenadora da mesa, ressaltou que os efeitos da crise climática já atingem diretamente milhões de brasileiros. “Hoje, crianças e adolescentes no nosso país sofrem a influência das ondas de calor, das enchentes, do excesso de chuvas, da seca e das queimadas. Antes, 40 graus era registrados uma ou duas vezes por ano. Agora, chegamos a 42, 44 graus por dias seguidos. O Pantanal teve, há dois anos, uma das maiores queimadas da sua história. Tudo isso é resultado da ação humana”, afirmou.
Em sua apresentação, Evangelina Araújo, médica patologista clínica, contextualizou o cenário global e destacou o risco de ultrapassarmos limites irreversíveis. “O ano de 2024 foi o mais quente da história, e isso já traz consequências graves para os ecossistemas e para a saúde humana. Se chegarmos a 4 °C, teremos uma situação incompatível com a vida normal em várias regiões do planeta, inclusive no Brasil”, alertou.
Ela lembrou que o país já apresenta aquecimento superior à média global e que biomas como Amazônia, Cerrado e Pantanal estão entre os mais vulneráveis. “O Brasil é um dos maiores emissores de gases de efeito estufa e, ao mesmo tempo, um dos que mais sofrerá com os efeitos do aquecimento. O desmatamento responde por mais de 50% das emissões nacionais”, disse.
A especialista também chamou atenção para o aumento de eventos extremos e os impactos na saúde pública. “Em 2024, as queimadas na Amazônia elevaram em até 80 vezes as concentrações de poluentes na atmosfera. A poluição do ar é responsável por 30% das mortes por infecção respiratória, quase metade dos óbitos por doença pulmonar obstrutiva crônica e está diretamente ligada a AVC, infarto e até diabetes”, destacou.
Evangelina reforçou a necessidade de maior protagonismo da saúde no debate climático. “O futuro depende da eliminação dos combustíveis fósseis até 2050, do fim imediato do desmatamento e do reflorestamento em larga escala. Se não agirmos agora, as próximas gerações viverão impactos muito mais severos e irreversíveis”.
Já Daniel Périgo, farmacêutico e bioquímico, trouxe para a discussão o papel estratégico do laboratório clínico na resposta a esse cenário. “Os estabelecimentos de saúde também são impactados pelas mudanças climáticas, seja pela demanda aumentada, pela ruptura na cadeia de insumos ou pela falta de água e energia em eventos extremos. É preciso pensar em riscos, oportunidades e adaptação”, afirmou. Segundo ele, os serviços de saúde respondem por até 6% das emissões globais, o que impõe responsabilidade direta ao setor.
Périgo citou exemplos de iniciativas em curso, como redução do uso de plásticos e solventes em metodologias laboratoriais, automação para diminuir resíduos, uso de energia renovável e novas soluções logísticas, como transporte de amostras por drones. “Precisamos criar uma cultura de sustentabilidade na saúde. Muitas melhorias técnicas já trazem ganhos ambientais, mas é necessário mensurar, registrar e transformar isso em metas de redução de emissões", destacou.
Ele reforçou ainda que a adaptação deve caminhar junto com inovação e oportunidades. “É possível unir eficiência operacional, inovação tecnológica e responsabilidade ambiental. O setor de saúde pode e deve ser protagonista também nesta pauta", reforçou Périgo.