Edição Jan-Fev 2025 Publicado em: 17 dezembro 2024 | 13:00h

Medicina Laboratorial avança e a SBPC/ML promove a ciência

Em entrevista ao Especial de Inovação do jornal Valor Econômico, diretores da SBPC/ML relatam a atuação da Sociedade e avanços do setor

A medicina laboratorial, está em constante evolução no Brasil, impulsionada por diversos fatores, entre os quais podemos citar os avanços tecnológicos, os desafios econômicos e mudanças nas demandas da população. Entre as principais tendências para os próximos anos, podemos destacar o maior foco em medicina personalizada. Testes genéticos, entre outros exames, permitem diagnósticos mais precisos e precoces de doenças, a identificação de predisposições genéticas e a personalização de tratamentos com base na predição de resposta do organismo e propensão ao desenvolvimento de eventos adversos.

Além disso, há a tendência de expansão de técnicas diagnósticas mais precisas, rápidas e sensíveis para identificação de patógenos, como as técnicas de Reação em cadeia da polimerase (PCR), espectrometria de massas, e metagenômica, que é o estudo do material genético recuperado diretamente de amostras ambientais ou clínicas por um método de sequenciamento de ácidos nucléicos, utilizando DNA como material de análise. A bioinformática se relaciona diretamente com esse avanço.

 

“O envelhecimento da população também traz uma tendência do gerenciamento de doenças crônicas, onde o laboratório tem papel fundamental em identificar riscos, diagnosticar doenças e indicar tratamento. O uso de inteligência de dados vem como uma ferramenta poderosa que auxilia tanto nos processos de garantia de qualidade dos resultados, automação de tarefas, melhorando a produtividade e reduzindo falhas, como também para predizer tendências e buscar melhores desfechos clínicos”, explica o presidente da SBPC/ML, Alvaro Pulchinelli Junior.

 

O desenvolvimento de tecnologias “Point of Care” (POCTs) cada vez mais confiáveis também é uma tendência para permitir o diagnóstico seguro próximo ao local de atendimento do paciente, como unidades de terapia intensiva, unidades de pronto atendimento e atendimento a catástrofes. E a discussão em torno da segurança do paciente vem se tornando pauta com cada vez maior destaque, com grande ênfase na participação do paciente nas suas decisões de saúde e na compreensão dos resultados laboratoriais.

E ainda, se destaca a preocupação com a sustentabilidade do meio ambiente, trazendo a busca da minimização da geração de resíduos e eficiência energética.

Investimento em Inovação 

O setor tem investido muito em inovação, tanto os laboratórios clínicos propriamente, como também a indústria diagnóstica. Os avanços tecnológicos nos equipamentos de análises laboratoriais são constantes, e a pesquisa básica e médica também vem somando muitas informações novas a cada dia.  E os profissionais do laboratório têm o papel de avaliar o que é realmente útil na prática médica e transformar essa inovação em uma tecnologia disponível para o paciente e o médico.

 

“Além disso, os modelos de equipamentos menores, que podem ficar instalados perto do local de atendimento do paciente (os chamados POCT), vêm evoluindo na busca de um desempenho parecido com os grandes equipamentos de áreas técnicas laboratoriais. Além disso, técnicas de análise inovadoras vêm ganhando força como sequenciamento, genômica (em especial o sequenciamento de nova geração), espectrometria de massas, análise baseada em metabolômica e proteômica”, complementa o vice-presidente da SBPC/ML, Guilherme de Oliveira.

 

A metabolômica é o estudo abrangente de metabólitos, ou pequenas moléculas de substratos, intermediários e produtos do metabolismo, dentro de células, fluidos biológicos, tecidos ou organismos. Já a proteômica estuda a distribuição, a abundância, as modificações, as interações e as funções de uma ou de um grupo de proteínas, ou do conjunto de proteínas em uma célula ou organismo. Todas elas agregam dentro do novo modelo de medicina de precisão, com grande volume de informações, de altíssima sensibilidade e cada vez em menor tempo.

 

“A digitalização de processos, inclusive a avaliação de imagens microscópicas, como sangue, medula óssea e mesmo fezes, é uma inovação que surge face à necessidade de padronização de processos, agilidade nos resultados e segurança na rastreabilidade das informações. Principalmente após a pandemia, muitas empresas têm se interessado em inovação tecnológica no diagnóstico de doenças, em especial as doenças infecciosas e câncer. Os testes moleculares rápidos e com múltiplos alvos são a “bola da vez”. Dentre elas podemos citar diagnóstico sindrômico rápido de infecções utilizando métodos de PCR e derivações, detecção de compostos voláteis, o chamado “nariz eletrônico” para identificação e detecção de patógenos e uso de nanotecnologia com alvos múltiplos”, explica o diretor científico da SBPC/ML, Andre Doi.

 

Como os laboratórios brasileiros são avaliados em termos de qualidade?

 

Desde a década de 70, os laboratórios clínicos brasileiros dispõem dos mesmos recursos em termos de automação e instrumentos analíticos usados nos países desenvolvidos. Para que obtivessem os benefícios da utilização desses recursos, os laboratórios tiveram que se adequar às boas práticas laboratoriais utilizadas em nível internacional.

“O setor do laboratório clínico no Brasil é muito regulamentado e as fiscalizações da Vigilância Sanitária são anuais. Eles avaliam diversos aspectos nos laboratórios de análises clínicas para garantir que os serviços prestados sejam seguros e de qualidade. Alguns dos principais pontos avaliados incluem: organização, conformidade com normas e regulamentos, infraestrutura, biossegurança, qualificação e capacitação dos profissionais, controle de qualidade interno e externo e segurança dos pacientes”, explica o diretor de Acreditação da SBPC/ML, Carlos Eduardo Ferreira.

Os usuários de serviços de laboratórios clínicos (pacientes e médicos) podem não ter acesso a informações suficientes que lhes permitam determinar se um laboratório opera em nível satisfatório. Deste modo, os melhores laboratórios brasileiros buscaram voluntariamente se inscrever em ensaios de proficiência, programas de benchmarking e acreditação da qualidade. Pois é do interesse dos laboratórios competentes que sua competência seja verificada, através de processo de inspeção, e comparação com padrões apropriados. A boa performance e postura são divulgadas publicamente.

 

“Ao final da década de 90, a Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML) lançou o Programa de Acreditação de Laboratórios Clínicos (PALC), de cunho educativo. A norma traz requisitos que se aplicam a qualquer porte de laboratório e, se incorporados aos processos e atividades laboratoriais, asseguram a qualidade dos resultados dos exames. O PALC, por meio de laboratórios acreditados, monitora cerca de 60% dos exames realizados no Brasil”, acrescenta o diretor de Relações Institucionais, Wilson Scholnik.

 

O Benchmarking Laboratorial é uma análise de comparação dos resultados entre laboratórios frente aos padrões de excelência do mercado. Ao utilizá-la, o laboratório aprimora seus processos, melhora os serviços e gera mais produtividade e oportunidades para a organização. “Podemos afirmar que os melhores laboratórios brasileiros oferecem serviços que não devem em nada aos melhores padrões internacionais”, afirma Wilson.

Desafios para o desenvolvimento da medicina diagnóstica no Brasil?

Consideramos que entre os principais desafios estão:

- A adequação dos laboratórios e clínicas de diagnóstico por imagem para proporcionar a interoperabilidade das informações geradas em seus laudos de exames.

- A demonstração do valor de novos exames para que sejam utilizados nos cuidados aos pacientes e incorporados à prática clínica (assim como a obsolescência de técnicas antigas) e a rápida evolução na análise de dados gerados para possibilitar previsibilidade e orientação das ações de saúde.

 - O aumento crescente dos custos por incorporação de tecnologias mais caras, além da questão da dependência de produtos importados, portanto, com influência do dólar, face à remuneração cada vez mais limitadora pelas fontes pagadoras.

Como o Brasil está posicionado a nível mundial? É um setor relevante?

O Brasil conta com uma medicina laboratorial de ponta, com grandes, modernos e equipados laboratórios. Temos pesquisa, inovação, incorporamos novas tecnologias muito rapidamente. Pela própria característica do país, destaca-se o custo efetividade. Em geral, os laboratórios brasileiros são comparáveis ao melhor nível internacional, em termos de estrutura laboratorial, tecnologia de ponta, maturidade dos requisitos regulatórios, inclusive normas de biossegurança, equipe qualificada, e disponibilidade de profissionais no mercado, que apesar de menor do que gostaríamos, ainda está em cenário melhor que muitos países desenvolvidos.

“Em questão de indicadores, podemos afirmar que estamos melhores que muitos outros países, e contamos com legislação estabelecida sobre controle de qualidade laboratorial, além de contarmos com programa de acreditação brasileiro. O conhecimento científico é bem disseminado na área laboratorial, temos congressos nacionais, cursos, jornadas e eventos científicos ao longo de todo o ano (oferecido pela SBPC/ML, pelos próprios laboratórios e outras entidades do setor). O Brasil conta com cerca de 15 mil laboratórios, somos 1.600 patologistas clínicos, que atuam em conjunto com os demais profissionais de saúde de atuação laboratorial”, comenta o diretor de Ensino, Leonardo Vasconcellos.

A Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML) tem entre seus objetivos assegurar a qualidade dos serviços prestados pelos laboratórios clínicos no Brasil. Ela é uma sociedade científica atuando na promoção da educação continuada, por meio de cursos, seminários, congressos e publicações científicas. Atuamos para garantir a qualidade dos serviços laboratoriais com várias iniciativas:

Desde 1977, através de uma parceria entre a SBPC/ML e a empresa ControlLab, oferecemos o programa de Controle Externo da Qualidade e a partir de 2005, a mesma parceria criou o Programa de Indicadores (Benchmarking). Esse programa visa proporcionar aos laboratórios clínicos uma ferramenta para medir, monitorar e comparar seus desempenhos em diversos aspectos operacionais e de qualidade. Através do uso de indicadores específicos, os laboratórios podem identificar pontos fortes e áreas que necessitam de melhorias, promovendo assim a melhoria contínua dos serviços prestados. Este programa foi reconhecido internacionalmente como uma das maiores experiências do tipo a nível mundial

Há 25 anos, a SBPC/ML criou o Programa de Acreditação de Laboratórios Clínicos (PALC) que é essencial para os laboratórios brasileiros, pois garante a qualidade e a segurança dos serviços prestados, assegurando que os exames laboratoriais sejam precisos e confiáveis. A acreditação pelo PALC promove uma cultura de melhoria contínua, capacitação profissional e eficiência operacional, aumentando a credibilidade e a competitividade dos laboratórios no mercado. Além disso, contribui para a segurança dos pacientes e a conformidade com regulamentações vigentes, proporcionando maior transparência e confiança nos resultados fornecidos.

Em 2023, os laboratórios acreditados pelo PALC realizaram 1,03 bilhão de exames, o que representa aproximadamente 47% do total de exames de análises clínicas realizados no Brasil. Portanto, quase metade dos exames foram avaliados pelo programa. Através dessas ações, a SBPC/ML busca fortalecer a especialidade de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial no Brasil, contribuindo para a melhoria contínua da qualidade dos serviços prestados e, consequentemente, para a saúde e o bem-estar da população.

“A Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML) atua como uma entidade que representa profissionais e laboratórios da área de Patologia Clínica e Medicina Laboratorial no Brasil.  Representamos os interesses dos profissionais e laboratórios associados, buscando melhorias nas condições de trabalho, na qualidade dos serviços prestados e na regulamentação da área. Promovemos a educação continuada e a capacitação dos profissionais que atuam nos laboratórios clínicos por meio de cursos, congressos, workshops e publicações científicas. Nosso último Congresso reuniu 7 mil participantes”, afirma a diretora de Comunicação, Annelise Correa.

A SBPC/ML estabelece padrões e diretrizes para a prática da Medicina Laboratorial, garantindo a qualidade dos serviços oferecidos pelos laboratórios. “Contribuímos para o avanço da ciência na Medicina Laboratorial, por meio da participação em pesquisas e divulgação de estudos relevantes na área. Mantemos intercâmbio com entidades internacionais, buscando o alinhamento com as melhores práticas e avanços globais na Medicina Laboratorial. Atuamos junto a órgãos de governo para buscar regulamentação de preços, inclusão de exames no rol, validação de métodos”, finaliza o presidente Alvaro Pulchinelli Junior.