Edição Set-Out 2024 Publicado em: 04 outubro 2024 | 13:41h

Um olhar para o futuro: painel reflete sobre os avanços e desafios no laboratório clínico

Com temáticas diversas e complementares, renomados especialistas abordaram desde a morfologia digital até os biomarcadores no manejo de doenças como o mieloma múltiplo

A discussão sobre os avanços e os desafios enfrentados pelo laboratório clínico, uma área essencial na medicina diagnóstica, movimentou uma mesa-redonda coordenada pela Dra. Lucilene Rodrigues, no penúltimo dia do 56º Congresso Brasileiro de Patologia Clínica e Medicina Laboratorial, em Salvador. A patologista clínica, responsável técnica pelo Laboratório de Urgência do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo - ICESP, e gerente médica da Dasa, comandou o painel que trouxe à tona temas de grande relevância para o futuro do setor.


Dr. Afonso Celso Almeida Cardoso, médico hematologista pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, apresentou o panorama atual da morfologia digital e suas perspectivas futuras. Para isso, ele fez um retrospecto desde a época em que as células começaram a ser identificadas de microscópios que ele classificou como rudimentares e a contagem era manual. “A morfologia digital está transformando a maneira como os laboratórios analisam amostras biológicas, substituindo o microscópio tradicional por tecnologias digitais de alta precisão”, pontuou.


Ele destacou que, ao digitalizar lâminas de exames, os laboratórios não só aumentam a precisão diagnóstica, mas também otimizam o tempo. “Com a inteligência artificial e o aprendizado de máquina, essas imagens são analisadas com uma precisão crescente, ajudando a detectar padrões sutis,” disse Dr. Afonso.


No entanto, ele lembrou a recomendação do International Council for Standardization in Haematology (ICSH), ou Conselho Internacional de Padronização em Hematologia - uma organização não-governamental que tem como objetivo melhorar a prática de laboratórios de hematologia -, sobre a necessidade de revisão manual. Um dos motivos é que a implementação dessa tecnologia ainda enfrenta desafios relacionados ao custo e à integração nos sistemas de saúde, o que passa pelo investimento em infraestrutura e capacitação.


Avanços na genômica do câncer


Existem 45 subtipos de linfoma, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Foi o que destacou o médico Dr. Paulo Campregher, responsável pelos testes de genômica do câncer, oncologia e hematologia de precisão do laboratório clínico do Hospital Israelita Albert Einstein. Ele fez uma abordagem empolgante sobre os avanços na genômica do câncer, que têm revolucionado a oncologia e o papel do laboratório clínico. 


Entre casos clínicos desafiadores e uma revisão da literatura disponível, o hematologista salientou que há uma crescente complexidade no diagnóstico, na avaliação genética e também nas novas modalidades terapêuticas, que, enfatiza ele, precisa ser incorporada à prática médica. 

“Com o sequenciamento de nova geração (NGS), é possível mapear alterações com muito mais rapidez e eficiência. O Target [exame capaz de detectar variações relevantes no DNA e RNA, como substituições, pequenas inserções, deleções e fusões gênicas, relacionadas a diversos tipos de tumores sólidos] era uma demanda do corpo clínico”, afirmou. Ele ressaltou como esse painel baseado em tecnologia de ponta e utilizando NGS está permitindo diagnósticos mais precisos e tratamentos personalizados. 


O médico ainda destacou o impacto da genômica no diagnóstico precoce, crucial para o sucesso do tratamento. “Hoje, conseguimos identificar mutações específicas que direcionam terapias-alvo, aumentando a eficácia e reduzindo efeitos colaterais em pacientes oncológicos”, explicou Campregher. 


Anticoagulantes orais de ação direta


A patologista clínica Dra. Marjorie Colombini abordou o impacto dos anticoagulantes orais de ação direta (DOACs) no laboratório clínico, uma classe de medicamentos amplamente utilizada para prevenir tromboses. "Embora os DOACs sejam altamente eficazes, eles trazem desafios para os laboratórios clínicos, já que os testes de coagulação convencionais podem não ser adequados para monitorar sua ação", explicou.


Dra. Marjorie detalhou como os laboratórios têm adaptado suas práticas para lidar com esses anticoagulantes, desenvolvendo novos métodos para monitorar o nível de medicação nos pacientes. “Em muitos casos, o teste padrão de coagulação não é suficiente. Precisamos de técnicas mais refinadas para garantir que esses pacientes sejam monitorados adequadamente, evitando complicações”, disse ela. 


A especialista também abordou a necessidade de diretrizes claras e padronizadas para o uso desses testes no ambiente clínico. Ela falou sobre aplicabilidades já estabelecidas de medicamentos como Rivaroxabana e Dabigatrana, usados para tratar e prevenir trombose e embolia pulmonar, interação medicamentosa, necessidade de monitoramento e outras especificidades. 


“No mundo real, a múltipla co-medicação deve ser feita com atenção, principalmente em idosos acima de 75 anos. Antes de iniciar o tratamento, precisa conhecer o status das funções hepática e renal”, alertou.


Biomarcadores e manejo do mieloma múltiplo


O chefe da unidade de Hematologia, Hemoterapia e Transplante de Medula Óssea do Hospital Universitário Professor Edgard Santos (HUPES/UFBA), Dr. Edvan Crusoé, falou sobre as perspectivas atuais no uso de biomarcadores no diagnóstico e manejo do mieloma múltiplo, um tipo de câncer que afeta as células plasmáticas. “Os biomarcadores estão mudando a maneira como diagnosticamos e acompanhamos o tratamento dos pacientes com mieloma múltiplo,” explicou. 


Ele destacou que o uso de biomarcadores, como a beta-2 microglobulina e a cadeia leve livre, está ajudando os médicos a detectar a doença em estágios mais precoces e a monitorar a resposta ao tratamento. “Os biomarcadores são fundamentais para avaliar a progressão da doença e ajustar as terapias de forma mais precisa, o que melhora significativamente o prognóstico dos pacientes,” afirmou Dr. Edvan. Segundo ele, 60% dos indivíduos são MGUS - gamopatia monoclonal de significado indeterminado, uma condição pré-maligna que pode evoluir para mieloma múltiplo.


Crusoé citou exames diagnósticos e de avaliação, mostrou a sistemática atual para identificar a doença. “Não é simples o diagnóstico”, constatou. Segundo ele, ainda há desafios na incorporação dos biomarcadores na prática clínica diária. “Precisamos de uma maior disponibilidade de testes sensíveis e específicos, além de um esforço contínuo para educar os profissionais de saúde sobre a importância desses marcadores no acompanhamento do mieloma múltiplo.”

 

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