Publicado em: 17 setembro 2025 | 13:00h

Diagnóstico básico: 47% da população mundial não tem acesso

Representantes do Ministério da Saúde, ANS, Conitec e KPMG refletiram sobre desafios enfrentados no Brasil

Os dados de que 47% da população global não tem nenhum ou pouco acesso ao diagnóstico, do relatório da The Lancet Commission on Diagnostics, atravessaram o debate sobre Políticas Públicas e Acesso a Diagnósticos Inovadores, realizado nesta quarta-feira (17), durante o 57° Congresso Brasileiro de Patologia Clínica/ Medicina Laboratorial, que acontece no Riocentro, até a próxima sexta-feira. Os dados foram trazidos por Carlos Eduardo Gouvêa, presidente executivo da CBDL – Câmara Brasileira de Diagnóstico Laboratorial, que, junto de Alvaro Pulchinelli Jr, presidente da SBPC/ML, coordenou a realização da mesa com participação de representantes de instituições públicas, como o Ministério da Saúde, Agência Nacional de Saúde Suplementar, Conitec, e privada, como a KPMG. 

“A própria OMS reconhece a importância do diagnóstico, depois de constatar que 47% da população global tem pouco ou quase nenhum acesso a ele. Por conta disso, a resolução 76.5 da OMS, que foi deliberada e aprovada em maio de 2023, traz várias obrigações para os países membros, como o Brasil, para a promoção do acesso ao diagnóstico, cada vez mais precoce e preciso. Está muito clara a importância de olhar para a jornada do paciente com esse olhar especial”, pontuou Carlos Eduardo Gouvêa, justamente, na data em que se celebra o Dia Internacional da Segurança do Paciente. 


Alisson Bigolin, como líder da Equipe de Diagnóstico do Departamento de HIV/Aids, Tuberculose, Hepatites Virais e IST com foco na elaboração de políticas públicas e diretrizes para o diagnóstico rápido e laboratorial das Infecções Sexualmente Transmissíveis, HIV e Hepatites Virais, apresentou “A Visão e atuação do Ministério da Saúde na Incorporação de Novas Tecnologias de Exames Laboratoriais”, como palestrante.  

Ele também lembrou que, segundo dados da OMS, 70% das decisões sobre os cuidados de saúde são tomadas com base em testes diagnósticos. Citou novamente o relatório da The Lancet Commission on Diagnostics, e disse que a publicação do mesmo instituto de maio de 2025,  revelou, que, em países de baixa renda, essa ausência de acesso ao diagnóstico aumenta para 81%.

“Mesmo o Brasil não sendo classificado como um país de baixa renda, a gente também não está tão distante dessa fragilidade de acesso a diagnósticos.  Mais de 3 em 4 adultos com diabetes vivem em países de baixa e média renda e 1 em cada 3 desses nunca teve nem a sua glicemia aferida. E cerca de 44% das mulheres em países de baixa e média renda nunca fizeram exames para câncer cervical, para rastreio de câncer cervical. Nesse sentido, já teve um avanço do Brasil em tentar incorporar novas abordagens tecnológicas para alcançar essas mulheres. Mas quando se fala de outros tipos de câncer, ainda dentro da antologia de doenças raras, esses números devem ficar ainda mais desafiadores. E há ainda um dado da OMS, que diz que apenas 3 a 5% dos investimentos de saúde são destinados para o serviço diagnóstico”, analisou Alisson Bigolin.


Ele lembrou da urgência na modernização do serviço no país: “Pensando em Brasil, na nossa dimensão de país continental, precisamos que as novas tecnologias sejam ágeis, e de fácil aplicação, contemplando locais remotos, para reduzir esse tempo entre a suspeita clínica e a conformação diagnóstica e, obviamente, impactar no sucesso do tratamento daquele usuário”.

Fotini Santos Toscas, doutora em Ciências pela Faculdade de Medicina da USP no tema de Avaliação e Incorporação de dispositivos médicos no SUS, coordenadora do Núcleo de Avaliação de Tecnologias em Saúde do Instituto de Saúde/SP e membro titular no Comitê de Produtos e Procedimentos da Conitec, apresentou “Os Processos para incorporação de novos testes na Conitec” . 

“A Conitec não decide o que entra, ela recomenda, e o Ministério da Saúde é quem decide sobre a implementação daquela tecnologia, e a partir dessa decisão, são 180 dias para disponibilização. Mas é preciso apresentar um dossiê, um relatório técnico fundamental que passará por uma análise crítica, na Conitec sobre o produto ou procedimento”, explicou ela, que também apresentou o cadastro para participação social neste processo: “É um cadastro aberto para especialistas em saúde, pacientes e associação e gestores do SUS, que participam da fase de consulta pública dos produtos e procedimentos submetidos a avaliação da Conitec”. 


Em seguida, foi a vez da Dra. Luciana F. Franco, especialista em patologista Clínica/Medicina Laboratorial, com mestrado e doutorado em Endocrinologia Clínica pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP, falar sobre “O Papel da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica e Medicina Laboratorial na incorporação de novos métodos diagnósticos”. Ela explicou sobre os processos da cadeia responsável por aprovar e disponibilizar todas as novidades na área. 

“A Avaliação de Tecnologias em Saúde orienta essa tomada de decisão baseada em três pilares: eficácia, segurança e custo-efetividade, que é o pilar estratégico para a sustentabilidade dos sistemas de saúde. No Brasil, a ATS é conduzida pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde, a Conitec, que está associada ao Ministério da Saúde, e ao Comitê Permanente de Regulação da Atenção à Saúde, que está ligado à ANS. E é importante também ter esse conceito de interoperabilidade entre os sistemas de informação, para avaliações mais abrangentes e eficazes, que vai reduzir os esforços e permitir o monitoramento contínuo das tecnologias incorporadas”, explicou.    


Ana Paula Cavalcante, psiquiatra e gerente de estímulo à avaliação e indução da qualidade setorial, apresentou “A Visão da ANS sobre a importância dos desenhos das linhas de cuidado no âmbito da Saúde Suplementar e o papel da inovação tecnológica nos exames laboratoriais”. 

“Vamos falar em linha de cuidado, que é essa padronização técnica, explicitando a organização dessa jornada do paciente no sistema de saúde, estabelecendo um percurso assistencial ideal nos diferentes níveis de atenção. A gente, às vezes, incorpora um procedimento solto, se os exames estão dispersos, se não existe essa linha de condução desse paciente. Perde-se tempo e o resultado no final é um resultado que não é o ideal ou que poderia ser melhor”, defendeu ela.


Kristin Pothier, vice-presidente global da KPMG, encerrou a mesa, com a visão dos investidores para a área de diagnóstico, com a palestra “Innovation accelerating and laboratory market dynamics shifting” (A inovação está acelerando e a dinâmica do mercado de laboratórios está mudando).

“Passamos muito tempo falando das implicações financeiras de novas tecnologias e de como a jornada do paciente é afetada. É preciso também levar em conta os aspectos geopolíticos atuais, por conta das atitudes dos Estados Unidos com as tarifas, e isso tem causado um estresse adicional. Mas ainda sim houve um pequeno aumento o volume de negócios no mundo dos diagnósticos, estamos acompanhando as tendências gerais, com expansão de negócios e de carteiras, com relação a dados, IA e medicina de precisão”, analisou.


A executiva da KPMG também declarou ter observado “uma verdadeira revolução na forma como o Brasil tem atuado em sua política regulatória, que está mais rápida e proativa devido ao trabalho das agências”.