Edição Set-Out 2025
Saúde da População Negra: SBPC/ML alerta para a importância da equidade e representatividade na medicina diagnóstica
O Dia Nacional de Mobilização Pró-Saúde da População Negra, celebrado hoje, dia 27 de outubro, chama atenção para a importância de discutir a saúde sob a perspectiva da Patologia Clínica e da Medicina Laboratorial, com foco em diversidade, equidade e inclusão.
De acordo com a Luisane Vieira, médica patologista clínica e membro da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica / Medicina Laboratorial (SBPC/ML) e consultora em gestão e acreditação de laboratórios, o principal objetivo é desmistificar a ideia de que existem parâmetros laboratoriais baseados em “raça”: “O Brasil é altamente miscigenado. Estudos genéticos mostram que não há correlação consistente entre cor da pele e herança genética. As diferenças observadas nos exames refletem, em grande parte, determinantes sociais, ambientais e alimentares, não fatores raciais biológicos”, explica.
Um exemplo importante dessa revisão é a CKD-EPI 2021, diretriz internacional que atualizou a fórmula para estimar a Taxa de Filtração Glomerular (TFG) - parâmetro usado na avaliação da função renal. O cálculo é feito a partir da creatinina sérica, substância cuja concentração no sangue reflete o desempenho dos rins. Até recentemente, fórmulas diferentes eram aplicadas a pessoas “afrodescendentes” e “não afrodescendentes”. A nova equação removeu o ajuste por raça, tornando o resultado mais preciso e reduzindo o viés diagnóstico. “A mudança reconhece que o impacto da ancestralidade africana na massa muscular não justifica distinções raciais fixas”, destaca a especialista.
Segundo a especialista, é fundamental entender e distinguir que o conceito de raça está ligado à uma construção cultural, baseada em fenótipos, com pouco respaldo científico, enquanto o conceito de etnia engloba aspectos culturais, linguísticos, históricos e genéticos compartilhados por um grupo antropologicamente definido. Já o conceito de ancestralidade refere-se ao conjunto de fatores genéticos transmitidos entre gerações, ligados às origens de cada pessoa.
A SBPC/ML reforça que a maioria das supostas diferenças raciais nos exames reflete desigualdades sociais e não biológicas. Ainda assim, grande parte dos intervalos de referência utilizados no Brasil baseia-se em dados estrangeiros, muitas vezes sem validação local, o que pode levar a interpretações equivocadas e desigualdades diagnósticas. Com a Norma PALC 2025, a SBPC/ML introduziu o conceito de Medicina Laboratorial Centrada na Pessoa, que exige dos laboratórios uma postura ativa em diversidade, equidade e inclusão. A entidade também recomenda que os profissionais colaborem com o Conselho Federal de Medicina (CFM) e o Ministério da Saúde para revisar parâmetros laboratoriais na Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN).
“Discutir a saúde da população brasileira considerando seus contextos sociais, culturais e econômicos é essencial. A equidade nos exames não é apenas uma questão técnica, é um compromisso ético com a representatividade e o cuidado centrado na pessoa”, conclui Luisane Vieira.

